Na semana passada, encontramos o sambista Renato Dias, na Vila Madalena. O intuito do encontro era explorar e conhecer um pouco mais a história do samba paulista e o trabalho que ele desenvolve com Max Frauendorf e Ligia Fernandes desde 2002, o Kolombolo - entidade sem fins lucrativos que se propõe a divulgar a batucada paulista.
Renato, como o próprio texto disponível no seu site diz, traz na sua trajetória a forte influência do samba inspirado nas batucadas das giras de Candomblé, sua religião presente nas guias usadas no pescoço e nas descrições da presença no samba paulista com a chegada dos escravos no interior e na capital.
Conhecedor da história do samba paulista, Renato se mostra, além de observador e ávido por novos projetos – o que o objetivou a fundar com os seus parceiros o Kolombolo – a sua vontade por mostrar ao público o samba desenvolvido aqui.
O que nos estimulou a procurar o sambista foi a nossa surpresa após comparecer no encontro realizado pelo Kolombolo, no último final de semana do mês de agosto, na Praça do Samba. Quantas mulheres dentro de uma única roda! Durante esse nosso projeto pudemos comparecer em algumas rodas e infelizmente a presença feminina ainda se mostra pequena e sem voz perante a maioria masculina. Porém, no Kolombolo notamos que a mulherada está sim presente e o melhor: de todas as formas, compondo, tocando, cantando...
A entrevista com o Renato durou cerca de 1h30, dentre inúmeras perguntas, risadas, compartilhamento de ideias, o questionamos sobre o preconceito contra as mulheres nas rodas e contamos sobre a nossa admiração ao ver que lá esse quadro já era bem diferente. Renato nos disse que já houve muito machismo no samba, que hoje sente isso muito mais leve, mas que nota ainda um preconceito contra as mulheres que tocam, “alguns ainda teimam em achar que elas não vão aguentar o tranco, que vão querer parar no meio da roda, mas aqui no Kolombolo é diferente, tem mulheres que tocam muito melhor que os homens e não priorizamos o sexo e sim a capacidade ou mesmo a vontade da pessoa em aprender e desenvolver um trabalho bacana”, afirma o sambista.
Para os que quiserem acompanhar um dos encontros realizados pelo Kolombolo, no dia 27 de setembro, próximo domingo, a partir das 15h, na Praça do Samba – Rua: Belmiro Braga, s/n, Pinheiros.
Segue também uma matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo, no dia 9 de setembro, sobre o trabalho “Projeto Memória do Samba Paulista”, desenvolvido pelo Kolombolo.
As diversas batucadas feitas na terra da garoa
Projeto Memória do Samba Paulista lança primeira leva de 12 CDs que registram as obras de Toniquinho Batuqueiro, das velhas guardas e de outros compositores
Francisco Quinteiro Pires
Nos anos 1940, quando Carlos Alberto Caetano e outros moradores da zona norte queriam sambar, tinham de atravessar o Centro para participar dos desfiles de escolas como Lavapés e Campos Elísios. Insatisfeito com a diretoria da Lavapés, Carlos fundou a Unidos do Peruche, em 1955. Nas décadas seguintes, ele se tornaria o Carlão do Peruche, um dos sambistas mais importantes de São Paulo.
Ouça trecho de TristezaDe outra insatisfação nasceu, em 2002, o Kolombolo, entidade sem fins lucrativos que se propõe a divulgar a batucada paulista. Em parceria com a ONG Sambatá, que explora a ascendência africana na cultura nacional, Kolombolo criou o Memória do Samba Paulista, série de 12 CDs, distribuídos pela Tratore, com as composições de sambistas paulistas e das velhas guardas. A direção artística é de Guga Stroeter. A produção, de Renato Dias e T. Kaçula. Segundo Renato, compositor e um dos fundadores da Kolombolo, as características do samba paulista são percebidas na interpretação e na linha melódica das obras gravadas. A instrumentação dos CDs adota o padrão carioca, difundido pelo Brasil. A formação mais comum é de violões 6 e 7 cordas, cavaco, tantã, cuíca, pandeiro e surdo, apesar do emprego, aqui e ali, da viola, do trompete, do pífano ou do violoncelo. "O samba de São Paulo é mais carregado, triste, e menos festivo", diz Renato. "É duro, com o pé arrastado no chão, herança indígena, do jeito de dançar dos tupis." E relembra o amálgama entre as matrizes africana, europeia e indígena que resultou na batucada da terra da garoa. Para ele, o projeto abala "a dificuldade de São Paulo assumir a sua cultura, em vez de ser apenas um consumidor das produções culturais de outros Estados". "Queremos fazer divulgação, não estamos a fim de discutir qual samba no Brasil é o melhor", ele alerta.Já foram lançados quatro dos 12 discos. Um deles é o da Velha Guarda do Peruche, com 13 sambas e uma faixa que traz declarações de Carlão do Peruche e Décio Ferreira. Os intérpretes, entre eles Carlão e Denise Camargo, se revezam em composições antigas e criadas para o projeto, como Repicar dos Tamborins (Carlão), Filial de Samba (Geraldo Filme/Narciso Lobo) e Caqui, Celeiro de Bambas (T. Kaçula/Renato Dias).Toniquinho Batuqueiro é o primeiro disco-solo, com 14 faixas, deste compositor nascido em Piracicaba, em 1929. Ele havia gravado algumas obras, junto com Geraldo Filme e Zeca da Casa Verde, em Plínio Marcos em Prosa e Samba - Nas Quebradas do Mundaréu (1974), disco fora de catálogo. A presença da viola no CD de Toniquinho realça as origens rurais da batucada paulista. "E na voz ele carrega a tradição dos cururuzeiros e tambozeiros, foi com eles que aprendeu a gingar e a versar", diz Renato. Toniquinho, cego há 10 anos, gravou composições novas, como Kolombolo, parceria com Renato e T. Kaçula, e Bolo de Fubá, da mesma dupla, além de antigas, como Ditado Antigo, Tristeza, Saco Vazio (com Zeca), e sambas-enredo para as escolas Rosas de Ouro, Peruche e Unidos da Vila Maria.Toniquinho é um dos integrantes da Embaixada do Samba Paulistano, fundada em 1995 para preservar o carnaval da cidade. A Embaixada assumiu a indicação dos cidadão e cidadã do samba de São Paulo. É formada por mais de 20 integrantes das velhas guardas. O repertório do CD da Embaixada, entre outros, registra Biografia do Samba (Talismã/Tabu), Meu Sabiá (Mestre Feijoada) e Lá Vem Ela (Fernando Penteado).Completa a primeira leva o grupo Tias Baianas Paulistas, idealizado por Valter Cardoso, em 1994, com integrantes da Nenê de Vila Matilde, Camisa Verde e Branco e Vai-Vai, para valorizar o papel das baianas nas agremiações. No CD, comparecem Grupo da Barra Funda (Dionísio Barbosa/Luiz Barbosa), O Nosso Coração É Claridade (Tabajara Rosa), entre outros.Em 2010 serão lançados os oito CDs restantes: Velha Guarda da Nenê de Vila Matilde; Ideval Anselmo e Zelão; Velha Guarda da Rosas de Ouro; Tio Mário; Velha Guarda do Vai-Vai; Denise Camargo; João Borba e Velha Guarda da Unidos de Vila Maria. Segundo Renato, "o resumo do projeto é uma frase de Plínio Marcos: "Um povo que não ama e não preserva suas formas de expressão mais autênticas jamais será um povo livre".
Renato, como o próprio texto disponível no seu site diz, traz na sua trajetória a forte influência do samba inspirado nas batucadas das giras de Candomblé, sua religião presente nas guias usadas no pescoço e nas descrições da presença no samba paulista com a chegada dos escravos no interior e na capital.
Conhecedor da história do samba paulista, Renato se mostra, além de observador e ávido por novos projetos – o que o objetivou a fundar com os seus parceiros o Kolombolo – a sua vontade por mostrar ao público o samba desenvolvido aqui.
O que nos estimulou a procurar o sambista foi a nossa surpresa após comparecer no encontro realizado pelo Kolombolo, no último final de semana do mês de agosto, na Praça do Samba. Quantas mulheres dentro de uma única roda! Durante esse nosso projeto pudemos comparecer em algumas rodas e infelizmente a presença feminina ainda se mostra pequena e sem voz perante a maioria masculina. Porém, no Kolombolo notamos que a mulherada está sim presente e o melhor: de todas as formas, compondo, tocando, cantando...
A entrevista com o Renato durou cerca de 1h30, dentre inúmeras perguntas, risadas, compartilhamento de ideias, o questionamos sobre o preconceito contra as mulheres nas rodas e contamos sobre a nossa admiração ao ver que lá esse quadro já era bem diferente. Renato nos disse que já houve muito machismo no samba, que hoje sente isso muito mais leve, mas que nota ainda um preconceito contra as mulheres que tocam, “alguns ainda teimam em achar que elas não vão aguentar o tranco, que vão querer parar no meio da roda, mas aqui no Kolombolo é diferente, tem mulheres que tocam muito melhor que os homens e não priorizamos o sexo e sim a capacidade ou mesmo a vontade da pessoa em aprender e desenvolver um trabalho bacana”, afirma o sambista.
Para os que quiserem acompanhar um dos encontros realizados pelo Kolombolo, no dia 27 de setembro, próximo domingo, a partir das 15h, na Praça do Samba – Rua: Belmiro Braga, s/n, Pinheiros.
Segue também uma matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo, no dia 9 de setembro, sobre o trabalho “Projeto Memória do Samba Paulista”, desenvolvido pelo Kolombolo.
As diversas batucadas feitas na terra da garoa
Projeto Memória do Samba Paulista lança primeira leva de 12 CDs que registram as obras de Toniquinho Batuqueiro, das velhas guardas e de outros compositores
Francisco Quinteiro Pires
Nos anos 1940, quando Carlos Alberto Caetano e outros moradores da zona norte queriam sambar, tinham de atravessar o Centro para participar dos desfiles de escolas como Lavapés e Campos Elísios. Insatisfeito com a diretoria da Lavapés, Carlos fundou a Unidos do Peruche, em 1955. Nas décadas seguintes, ele se tornaria o Carlão do Peruche, um dos sambistas mais importantes de São Paulo.
Ouça trecho de TristezaDe outra insatisfação nasceu, em 2002, o Kolombolo, entidade sem fins lucrativos que se propõe a divulgar a batucada paulista. Em parceria com a ONG Sambatá, que explora a ascendência africana na cultura nacional, Kolombolo criou o Memória do Samba Paulista, série de 12 CDs, distribuídos pela Tratore, com as composições de sambistas paulistas e das velhas guardas. A direção artística é de Guga Stroeter. A produção, de Renato Dias e T. Kaçula. Segundo Renato, compositor e um dos fundadores da Kolombolo, as características do samba paulista são percebidas na interpretação e na linha melódica das obras gravadas. A instrumentação dos CDs adota o padrão carioca, difundido pelo Brasil. A formação mais comum é de violões 6 e 7 cordas, cavaco, tantã, cuíca, pandeiro e surdo, apesar do emprego, aqui e ali, da viola, do trompete, do pífano ou do violoncelo. "O samba de São Paulo é mais carregado, triste, e menos festivo", diz Renato. "É duro, com o pé arrastado no chão, herança indígena, do jeito de dançar dos tupis." E relembra o amálgama entre as matrizes africana, europeia e indígena que resultou na batucada da terra da garoa. Para ele, o projeto abala "a dificuldade de São Paulo assumir a sua cultura, em vez de ser apenas um consumidor das produções culturais de outros Estados". "Queremos fazer divulgação, não estamos a fim de discutir qual samba no Brasil é o melhor", ele alerta.Já foram lançados quatro dos 12 discos. Um deles é o da Velha Guarda do Peruche, com 13 sambas e uma faixa que traz declarações de Carlão do Peruche e Décio Ferreira. Os intérpretes, entre eles Carlão e Denise Camargo, se revezam em composições antigas e criadas para o projeto, como Repicar dos Tamborins (Carlão), Filial de Samba (Geraldo Filme/Narciso Lobo) e Caqui, Celeiro de Bambas (T. Kaçula/Renato Dias).Toniquinho Batuqueiro é o primeiro disco-solo, com 14 faixas, deste compositor nascido em Piracicaba, em 1929. Ele havia gravado algumas obras, junto com Geraldo Filme e Zeca da Casa Verde, em Plínio Marcos em Prosa e Samba - Nas Quebradas do Mundaréu (1974), disco fora de catálogo. A presença da viola no CD de Toniquinho realça as origens rurais da batucada paulista. "E na voz ele carrega a tradição dos cururuzeiros e tambozeiros, foi com eles que aprendeu a gingar e a versar", diz Renato. Toniquinho, cego há 10 anos, gravou composições novas, como Kolombolo, parceria com Renato e T. Kaçula, e Bolo de Fubá, da mesma dupla, além de antigas, como Ditado Antigo, Tristeza, Saco Vazio (com Zeca), e sambas-enredo para as escolas Rosas de Ouro, Peruche e Unidos da Vila Maria.Toniquinho é um dos integrantes da Embaixada do Samba Paulistano, fundada em 1995 para preservar o carnaval da cidade. A Embaixada assumiu a indicação dos cidadão e cidadã do samba de São Paulo. É formada por mais de 20 integrantes das velhas guardas. O repertório do CD da Embaixada, entre outros, registra Biografia do Samba (Talismã/Tabu), Meu Sabiá (Mestre Feijoada) e Lá Vem Ela (Fernando Penteado).Completa a primeira leva o grupo Tias Baianas Paulistas, idealizado por Valter Cardoso, em 1994, com integrantes da Nenê de Vila Matilde, Camisa Verde e Branco e Vai-Vai, para valorizar o papel das baianas nas agremiações. No CD, comparecem Grupo da Barra Funda (Dionísio Barbosa/Luiz Barbosa), O Nosso Coração É Claridade (Tabajara Rosa), entre outros.Em 2010 serão lançados os oito CDs restantes: Velha Guarda da Nenê de Vila Matilde; Ideval Anselmo e Zelão; Velha Guarda da Rosas de Ouro; Tio Mário; Velha Guarda do Vai-Vai; Denise Camargo; João Borba e Velha Guarda da Unidos de Vila Maria. Segundo Renato, "o resumo do projeto é uma frase de Plínio Marcos: "Um povo que não ama e não preserva suas formas de expressão mais autênticas jamais será um povo livre".
Muito Boa a matéria...e o grupo é muito bom também...merecem espaço e sucesso...beijos meninos!
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